Parece que a substância milagrosa é o propanolol, que funciona como antagonista da adrenalina. Ao que consta, as quantidades elevadas de adrenalina que são libertadas no organismo após um acontecimento traumático, contribuem para "gravar" de tal forma esse acontecimento na memória, que é muito mais facilmente recordado do que outros eventos neutros ou até mais agradáveis (deve ser por isso que se diz que nos lembramos muito mais do que nos aconteceu de mau do que o que nos aconteceu de bom...). Pois este propanolol impede a ligação da adrenalina aos receptores adrenérgicos e se for tomado a seguir ao acontecimento ou à recordação do mesmo, este não vai ficar tão gravado porque a adrenalina não vai surtir efeito. É qualquer coisa deste género, trocando por miúdos, se quiserem mais detalhes vão a esta página.
O resultado é que pessoas que sofrem de stress pós-traumático, por exemplo, conseguem passar a recordar o que lhes aconteceu sem terem ataques de pânico e ficarem completamente desequilibradas, como costuma acontecer. Pelo contrário, perante a imagem do sucedido não sentem nada, lembram-se daquilo como de outra coisa qualquer que não lhes despertasse qualquer sensação, como se tivesse acontecido a outra pessoa e não a elas.
Claro que isto já levantou uma discussão ética, uns dizem que se é bom, porque não toda a gente tomar, outros alegam que estando acessível a qualquer pessoa pode ser tomado de forma errada, e qualquer pessoa que queira esquecer qualquer coisa que tenha feito de mal e com a qual não se sinta bem pode passar a tomar o propanolol e deixa de ser sentir culpado ou envergonhado, etc...
Um dos meus livros favoritos é "O Homem e o Espectro", de Charles Dickens. Curiosamente, o tema é exactamente este, um homem que quer esquecer algo que lhe aconteceu no passado e que é tão marcante que o atormentou o resto da vida...até ao dia em que, não pelo propanolol mas por um acordo com uma entidade (o espectro), ele esqueceu esse momento e deixou de sofrer. Tal como as pessoas que tomaram propanolol, deixou de sentir. Mas ele deixou de sentir fosse o que fosse, a insensibilidade e a "amnésia" não era só em relação àquele momento em particular mas em relação a tudo. Ele via as pessoas, até as reconhecia, mas não sentia absolutamente nada...e isso acabou por ter consequências catastróficas.
Se o propanolol pode ajudar a ultrapassar momentos traumáticos, acho que deve ser tomado...mas apenas nesses casos, para ajudar pessoas que sofrem de stress pós-traumático. Mas...
Será que a perda da "memória" não se vai estender a outros momentos da vida da pessoa? Pelo que vi não há nada que garanta que só vai acontecer para o momento que se pretende esquecer...Será que não pode haver uma "dessensibilização" completa da pessoa que tomar o "remédio do esquecimento"? Como na história de Charles Dickens...
1 comment:
Só hoje é que consegui vir ler o post. Realmente é bastante difícil decidir se se deve ou não tomar... Talvez com mais estudos se possa descobrir até que ponto é que a memória é afectada, e aí então tomar uma decisão. É óbvio que acho que não deve estar disponível para todos mas, para aquelas pessoas que passaram por algo muito mau e que não lhes permite ter uma vida normal, acho que não é justo sofrer uma vida inteira.
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